segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

1808 - O Brasil no Centro do Império Português

Chegada da corte portuguesa ao Brasil,
 em 1808. 
Domínio Público.
A corte portuguesa era a mais Carola da Europa, baseada e mantida em vigas tradicionais e conservadoras com forte influência da igreja católica. Este lado conservador coloca a corte portuguesa em forma de evidência sob o aspecto de sua constituição e sobrevivência, mas não era formada apenas de ignorância.


Considerando o pequeno tamanho geográfico do reino português na Europa, ainda assim representou um dos maiores impérios do mundo. Desprendidos de seus territórios europeus foram além da ideia dos fenícios no comércio além-mar, pois buscavam comércio sustentados por domínio geopolítico. O império Português incluía os territórios de Portugal, Algarves, Ilha de Madeira, Cabo Verde, Guiné-Equatorial, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Goa, Damão e Diu na Índia, Timor-Leste, Macau na China e Brasil. Além de ser o único Império autorizado a realizar comércio nos portos do Japão Imperial.


Todas as grandes nações e impérios fazem disputas com outra, não necessariamente se transformando em guerra e os rivais não são imutáveis, neste período existia uma luta de poder entre França e Inglaterra, que influenciava outras dualidades. Para Portugal a Espanha fazia esse papel de rival.


Na leitura tradicional e resumida vemos a Espanha adepta e sub julgada a política e gerência francesa, enquanto Portugal foi cooptado pelo lado inglês da força, mas tal história não foi tão simples sobre uma ótica mais realista. Inicialmente podemos destacar o império carola português com um parceiro calvinista e mais voltada a modernidade lucrativa (os primórdios do capitalismo), não que o sinônimo do império Português se baseava em outra coisa que não fosse o lucro nu e cru de todas as suas empreitadas. Entretanto a forma de extrair tal lucro deveria ter o aval de suas bases conservadoras e religiosas.


O autor Laurentino Gomes na sua obra “1808: Como Uma Rainha Louca, Um Príncipe Medroso e Uma Corte Corrupta Enganaram Napoleão e Mudaram a História de Portugal e do Brasil”¹ destaca que o comandante da Esquadra inglesa Capitão J. Smith tinha duas ordens contraditórias, uma para escoltar a esquadra Portuguesa em fuga para o Brasil devido a invasão das tropas francesas sob o território português e outra ordem para bombardear Lisboa e inutilizar a Marinha Portuguesa no caso da Coroa não embarcar na fuga para o Brasil.


Não faltavam motivos para as duas ordens. Pois a corte portuguesa fazia um jogo duplo entre a França e a Inglaterra, logo o clássico Dom João e sua gestão da indecisão colocam o Império em xeque. No final o plano de transferência da corte para o Brasil foi concretizado e os ingleses realizaram a escolta dos portugueses até as terras Tupiniquins.


Novamente ressalto a importância da obra de Laurentino Gomes “1808: Como Uma Rainha Louca, Um Príncipe Medroso e Uma Corte Corrupta Enganaram Napoleão e Mudaram a História de Portugal e do Brasil” de Laurentino Gomes que explica de forma leve os pormenores de uma Corte de imagem adoentada e viciada nas suas tradições católicas conservadoras, levando ao entendimento sobre quais condições o império inglês coopta a corte portuguesa, em quais condições as tropas francesas chegam em Lisboa, a possibilidade de resistência portuguesa frente a tropas napoleônicas, detalha as vezes que o plano de transferência da corte já tinha sido cogitado (não era a primeira vez), dentre outros valiosos assuntos.


Ainda sobre a transferência existe uma polêmica entre autores, para uns fuga e para outros transferência, na minha ótica pouco acrescenta no entendimento histórico a palavra e sim seu conteúdo, desta forma entendo como uma fuga e também transferência, de primeiro simples fuga de toda a corte e seus os elementos importantes para a historiografia portuguesa,  se mostrando na história brasileira como transferência da corte por de fato mudar o Brasil para o centro do império Português e trazer alguma modernização ao nosso território.


A Fuga portuguesa envolveu mais de 15 mil pessoas, todas as embarcações portuguesas não tinham a capacidade de transportar a quantidade de pessoas que foram acomodados e com falta de suprimentos. Chegaram ao Brasil caindo aos pedaços as embarcações e as pessoas em situação de penúria. Mulheres carecas devido surto de piolho nos navios e o medo de escorbuto latente. Até mesmo o Rei foi convidado para ser passageiro de um dos navios ingleses que realizava a escolta, porém recusou evitando ampliar a vergonha de já ser subjugado política e economicamente, também seria humilhado moralmente.


Enquanto o Brasil de 1807 para trás representava o domínio de portugueses, muitos novos cristãos com foco específico em retirar o máximo da terra com mínimo de trabalho, para tanto escravizavam e matavam como bem entendiam. Nas palavras de Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil²:

"O que o português vinha buscar era, sem dúvidas, a riqueza, mas riqueza que custa ousadia, não riqueza que custa trabalho. A mesma, em suma, que se tinha costumado a alcançar na Índia com as especiarias e os metais preciosos. Os lucros que proporcionou de início, o esforço de plantar a cana e fabricar o açúcar para os mercados europeus, compensavam abundantemente esse esforço - efetuado, de resto, com as mãos e os pés dos negros -, mas era preciso que fosse muito simplificado, restringindo-se ao estrito necessário às diferentes operações."


A chegada da Comitiva de políticos, servidores públicos e demais apoiadores da corte não iriam transformar o aspecto fundamental do Brasil de país agrário para industrial, assim como Portugal também não era, mas daria maior ênfase na criação de uma política nacional que aos poucos consolidariam o modelo português de Administração Pública.


Não podemos compreender bem a era dos 1800 que além de não existir um sentimento popular de pertencimento a uma nação, o sentimento mais próximo que poderia existir era o de pertencimento a um império que não poderia ser real sem a figura das monarquias representadas pelos Reis, Príncipes, Rainhas e Princesas, nessa ordem, tendo em vista o forte machismo existente.


A Corte representaria assim alguma limitação de ditames dos coronéis, mesmo que mínimos, pois, ainda exerciam forte influência no governo e na sobrevivência do império. Não se tornou mais sadia a vida dos dominados, entretanto para aquela época era o mais próximo de direitos mínimos, como não matar sem análise mínima de regras, muito embora não eram muito respeitadas pelos donos da terra.


O modelo de condução política gerenciada por lobbies de determinados setores conforme a maior concentração de riqueza com líderes que não trabalham, não foi novidade no império Português, assim como não o era no inglês, por exemplo, antes da revolução industrial na Inglaterra os mesmos eram considerados o povo mas tendente a ociosidade e ao apego a regalias desvinculadas do trabalho da região européia³, com a Revolução Industrial foi realizada a propaganda em larga escala como se os ingleses fossem os defensores do trabalho, enquanto na verdade sempre foram grandes exploradores dos trabalhadores e o luxo da classe dominante inglesa foi alcançada ao custo de vidas dos escravos (indígenas e negros) no Brasil, Índia e outras regiões do mundo.


A cultura do apego a ociosidade como um item das elites e o trabalho vinculado a população pobre era uma característica deste mundo dos mil e oitocentos, mas na verdade já tinha mais de 2.000 anos de tradição, até mesmo o nome trabalho deriva da palavra tripalium que era uma ferramenta de castigo.


Os portugueses aperfeiçoaram de forma terrível o método de governar com foco no lucro, para tanto subjugavam pessoas indefesas em escala industrial para suas causas financeiras, até mesmo a limitação que a coroa realizava tinha tal intuito, ou seja, matar indígenas era um problema financeiro para coroa, já que mão de obra escrava era escassa. Logo a norma era aceita pela maioria de seus financiadores, caso contrário a própria coroa poderia ser derrubada.


Importante destacar que a corrupção está presente em todos os governos humanos, sua maior ou menor utilização acontece na medida da força e respeito que as instituições tenham, logo, quando ler ou escutar que ao aprimorar a democracia consequentemente estará tornando instituições mais confiáveis e capazes de fiscalizar com autonomia as ilegalidades, tem o conceito de luta contra a corrupção. Não significa que todas as instituições devem abandonar seus planos de melhoria e Compliance, muito pelo contrário a função de aperfeiçoamento é dever de todos, inclusive dos Governos em não aparelhar infamemente as instituições como era (e talvez o seja atualmente) o padrão de governo nos mil e oitocentos.


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Referências Bibliográficas:

¹ Gomes, Laurentino. 1808: Como Uma Rainha Louca, Um Príncipe Medroso e Uma Corte Corrupta Enganaram Napoleão e Mudaram a História de Portugal e do Brasil. Edição revista e ampliada. Editora Globo, 2023.

² Holanda, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. 26. Ed. São Paulo. Companhia das Letras, 1995. Pág. 49.

³ Holanda, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. 26. Ed. São Paulo. Companhia das Letras, 1995. Pág. 45.


Por Jeferson Nascimento 
Editor e Colunista do Mídias Populares