Chegada da corte portuguesa ao Brasil, em 1808. Domínio Público. |
Considerando
o pequeno tamanho geográfico do reino português na Europa, ainda assim
representou um dos maiores impérios do mundo. Desprendidos de seus territórios
europeus foram além da ideia dos fenícios no comércio além-mar, pois buscavam
comércio sustentados por domínio geopolítico. O império Português incluía os
territórios de Portugal, Algarves, Ilha de Madeira, Cabo Verde,
Guiné-Equatorial, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Goa, Damão e Diu na Índia, Timor-Leste,
Macau na China e Brasil. Além de ser o único Império autorizado a realizar
comércio nos portos do Japão Imperial.
Todas
as grandes nações e impérios fazem disputas com outra, não necessariamente se
transformando em guerra e os rivais não são imutáveis, neste período existia
uma luta de poder entre França e Inglaterra, que influenciava outras dualidades.
Para Portugal a Espanha fazia esse papel de rival.
Na
leitura tradicional e resumida vemos a Espanha adepta e sub julgada a política
e gerência francesa, enquanto Portugal foi cooptado pelo lado inglês da força,
mas tal história não foi tão simples sobre uma ótica mais realista.
Inicialmente podemos destacar o império carola português com um parceiro
calvinista e mais voltada a modernidade lucrativa (os primórdios do capitalismo),
não que o sinônimo do império Português se baseava em outra coisa que não fosse
o lucro nu e cru de todas as suas empreitadas. Entretanto a forma de extrair
tal lucro deveria ter o aval de suas bases conservadoras e religiosas.
O autor
Laurentino Gomes na sua obra “1808: Como Uma Rainha Louca, Um Príncipe Medroso e Uma Corte Corrupta Enganaram Napoleão e Mudaram a História de Portugal e do Brasil”¹ destaca que o comandante da Esquadra
inglesa Capitão J. Smith tinha duas ordens contraditórias, uma para escoltar a
esquadra Portuguesa em fuga para o Brasil devido a invasão das tropas francesas
sob o território português e outra ordem para bombardear Lisboa e inutilizar a
Marinha Portuguesa no caso da Coroa não embarcar na fuga para o Brasil.
Não
faltavam motivos para as duas ordens. Pois a corte portuguesa fazia um jogo
duplo entre a França e a Inglaterra, logo o clássico Dom João e sua gestão da
indecisão colocam o Império em xeque. No final o plano de transferência da corte
para o Brasil foi concretizado e os ingleses realizaram a escolta dos
portugueses até as terras Tupiniquins.
Novamente
ressalto a importância da obra de Laurentino Gomes “1808: Como Uma Rainha Louca, Um Príncipe Medroso e Uma Corte Corrupta Enganaram Napoleão e Mudaram a História de Portugal e do Brasil” de Laurentino Gomes que explica de forma
leve os pormenores de uma Corte de imagem adoentada e viciada nas suas
tradições católicas conservadoras, levando ao entendimento sobre quais
condições o império inglês coopta a corte portuguesa, em quais condições as
tropas francesas chegam em Lisboa, a possibilidade de resistência
portuguesa frente a tropas napoleônicas, detalha as vezes que o plano de
transferência da corte já tinha sido cogitado (não era a primeira vez), dentre
outros valiosos assuntos.
Ainda
sobre a transferência existe uma polêmica entre autores, para uns fuga e para
outros transferência, na minha ótica pouco acrescenta no entendimento histórico
a palavra e sim seu conteúdo, desta forma entendo como uma fuga e também transferência,
de primeiro simples fuga de toda a corte e seus os elementos importantes para a
historiografia portuguesa, se mostrando
na história brasileira como transferência da corte por de fato mudar o Brasil
para o centro do império Português e trazer alguma modernização ao nosso
território.
A Fuga
portuguesa envolveu mais de 15 mil pessoas, todas as embarcações portuguesas não tinham a capacidade de
transportar a quantidade de pessoas que foram acomodados e com falta de
suprimentos. Chegaram ao Brasil caindo aos pedaços as embarcações e as pessoas
em situação de penúria. Mulheres carecas devido surto de piolho nos navios e o
medo de escorbuto latente. Até mesmo o Rei foi convidado para ser passageiro de
um dos navios ingleses que realizava a escolta, porém recusou evitando ampliar
a vergonha de já ser subjugado política e economicamente, também seria
humilhado moralmente.
Enquanto
o Brasil de 1807 para trás representava o domínio de portugueses, muitos novos
cristãos com foco específico em retirar o máximo da terra com mínimo de trabalho, para tanto escravizavam e matavam como bem entendiam. Nas palavras de Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil²:
"O que o português vinha buscar era, sem dúvidas, a riqueza, mas riqueza que custa ousadia, não riqueza que custa trabalho. A mesma, em suma, que se tinha costumado a alcançar na Índia com as especiarias e os metais preciosos. Os lucros que proporcionou de início, o esforço de plantar a cana e fabricar o açúcar para os mercados europeus, compensavam abundantemente esse esforço - efetuado, de resto, com as mãos e os pés dos negros -, mas era preciso que fosse muito simplificado, restringindo-se ao estrito necessário às diferentes operações."
A
chegada da Comitiva de políticos, servidores públicos e demais apoiadores da
corte não iriam transformar o aspecto fundamental do Brasil de país agrário
para industrial, assim como Portugal também não era, mas daria maior ênfase na
criação de uma política nacional que aos poucos consolidariam o modelo português
de Administração Pública.
Não
podemos compreender bem a era dos 1800 que além de não existir um sentimento
popular de pertencimento a uma nação, o sentimento mais próximo que poderia
existir era o de pertencimento a um império que não poderia ser real sem a figura
das monarquias representadas pelos Reis, Príncipes, Rainhas e Princesas, nessa
ordem, tendo em vista o forte machismo existente.
A Corte
representaria assim alguma limitação de ditames dos coronéis, mesmo que mínimos, pois, ainda exerciam forte influência no governo e na sobrevivência do império. Não
se tornou mais sadia a vida dos dominados, entretanto para aquela época era o
mais próximo de direitos mínimos, como não matar sem análise mínima de regras,
muito embora não eram muito respeitadas pelos donos da terra.
O
modelo de condução política gerenciada por lobbies de determinados setores
conforme a maior concentração de riqueza com líderes que não trabalham, não foi novidade no império Português,
assim como não o era no inglês, por exemplo, antes da revolução industrial na
Inglaterra os mesmos eram considerados o povo mas tendente a ociosidade e ao apego
a regalias desvinculadas do trabalho da região européia³, com a Revolução
Industrial foi realizada a propaganda em larga escala como se os ingleses
fossem os defensores do trabalho, enquanto na verdade sempre foram grandes exploradores
dos trabalhadores e o luxo da classe dominante inglesa foi alcançada ao custo
de vidas dos escravos (indígenas e negros) no Brasil, Índia e outras regiões do
mundo.
A
cultura do apego a ociosidade como um item das elites e o trabalho vinculado a
população pobre era uma característica deste mundo dos mil e oitocentos, mas na verdade já
tinha mais de 2.000 anos de tradição, até mesmo o nome trabalho deriva da
palavra tripalium que era uma
ferramenta de castigo.
Os
portugueses aperfeiçoaram de forma terrível o método de governar com foco no lucro,
para tanto subjugavam pessoas indefesas em escala industrial para suas causas
financeiras, até mesmo a limitação que a coroa realizava tinha tal intuito, ou
seja, matar indígenas era um problema financeiro para coroa, já que mão de obra
escrava era escassa. Logo a norma era aceita pela maioria de seus
financiadores, caso contrário a própria coroa poderia ser derrubada.
Importante destacar que a corrupção está presente em todos os governos humanos, sua maior ou menor utilização acontece na medida da força e respeito que as instituições tenham, logo, quando ler ou escutar que ao aprimorar a democracia consequentemente estará tornando instituições mais confiáveis e capazes de fiscalizar com autonomia as ilegalidades, tem o conceito de luta contra a corrupção. Não significa que todas as instituições devem abandonar seus planos de melhoria e Compliance, muito pelo contrário a função de aperfeiçoamento é dever de todos, inclusive dos Governos em não aparelhar infamemente as instituições como era (e talvez o seja atualmente) o padrão de governo nos mil e oitocentos.
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Referências Bibliográficas:
¹ Gomes, Laurentino. 1808: Como Uma Rainha Louca, Um Príncipe Medroso e Uma Corte Corrupta Enganaram Napoleão e Mudaram a História de Portugal e do Brasil. Edição revista e ampliada. Editora Globo, 2023.
² Holanda, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. 26. Ed. São Paulo. Companhia das Letras, 1995. Pág. 49.
³ Holanda, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. 26. Ed. São Paulo. Companhia das Letras, 1995. Pág. 45.